Três amigas me ligando/escrevendo chorando porque estão machucadas
física e emocionalmente. Todas professoras e pesquisadoras como eu. Os
agressores também. É muito homem doente e desequilibrado seguindo o
mesmo roteiro de perversão e violência: a mulher é phoda na profissão,
bonita, independente e sexualmente super ativa. O cara fica alucinado,
quer porque quer namorar/casar e tudo. Quando ele comeca a perceber que
tudo aquilo que o atraiu também atrai outros homens, começa a tortura:
ele exige afastamento de alguns amigos, invade contas de imeio, zap e
inbox de fb, começa a dar vexame publico: esmurrar outros homens
enquanto privadamente vai chamando a mulher de velha e gorda - como
aconteceu com uma dessas amigas. Ao mesmo tempo as juras de amor
aumentam publicamente na mesma velocidade das desculpas e planos para o
futuro. Frágil e apaixonada, a tortura no privado permanece, as brigas
aumentam e as agressões e humilhações pioram: empurrões, xingamentos,
términos seguidos de sexo louco: "eu preciso comer outras mulheres pra
saber se é isso mesmo o que eu sinto por você e porque o seu passado
...". Quando a mulher se dá conta das violências na maioria das vezes
não sabe o que fazer porque o agressor é gente boa de doer com a geral e
ela está destruída. Pra piorar: se ela revida às agressões físicas e
humilhações, pronto: a trama se fecha. Todo mundo sabia que ela era
louca. Louca porque gosta de namorar. Louca porque vive a própria vida.
Louca porque ela namorou sei lá quem. Louca porque tem senso de humor.
Louca porque não tem. Louca porque sabe se colocar na linha de frente.
Louca porque não apagou as mensagens de uma história de 2017, louca
porque apagou mensagem privada e "aí tem coisa", como a outra amiga.
Louca porque não quer engravidar com mais de 40 anos. Louca porque ele
quer mais um filho e ela também quer. Louca porque defendeu o amigo de
um ataque homofóbico aos gritos. Louca. Louca. Louca. Uma dessas amigas
ouviu do ex que ela tem o gênio difícil, "muito conflitiva". Sempre
louca. Nossas mães eram loucas. Nossas avós eram loucas. Louca porque a
mulher precisou tirar forças de algum lugar pra seguir adiante. Pra
explicar para os filhos as violências, os xingamentos na frente deles,
os silêncios dos que se aproximam e somem, explicar os roxos pelo corpo,
as brigas pelas bebedeiras e bebedeiras, as mentiras, as humilhações.
Somos as loucas independente de qualquer coisa. Sempre fomos e sempre
seremos. Quietas ou falantes. Já os agressores são sensatos,
equilibrados, ponderados até a próxima louca aparecer e ciclo se repetir
à exaustão. O agressor de uma dessas amigas era fofo - ao menos eu cai
nessa esparrela de achar isso. Chorei muito com o sofrimento e os
soluços das minhas amigas. Se você é mulher e nunca passou por isso: que
bom. Você não precisar pisar nos Alpes suíços para comprovar que eles
existem, né?! Seja empática com as mulheres. Seja mais empática ainda
com as mulheres que romperam o silêncio e passam a conviver com os
olhares tortos das outras mulheres no ambiente de trabalho. Seja mais
mais mais mais mais mais mais empática ainda com as mulheres que não tem
força para romper com o silêncio: por medo da exposição no ambiente de
trabalho - como é o caso das minhas amigas -, de reviver as violências
na infância, da culpa imensa porque ela respondeu à violência sofrida
com violência. Seja empática e respeite-as. Escute-as: elas precisam
falar. Estenda a mão mesmo que essa mão não seja mais a mesma porque um
dos dedos está torto pra sempre em razão de uma fratura por agressão.